A HISTÓRIA DO BULLMASTIFF PARTE I – A ORIGEM

Por André Antunes Coltre
Escrito em: 10/11/2016
Primeira revisão: 25/06/2018
Segunda revisão: 07/10/2023

     O desenvolvimento da raça, a partir, das informações e registros de David Hancock, pesquisador cinófilo por mais de 50 anos, coronel aposentado do exército britânico, onde trabalhou com cães de guerra e serviu em 22 países diferentes, escritor de vários livros e centenas de artigos para revistas, foi conselheiro de raça e juiz, sua biblioteca de imagens possui mais de 5.000 representações de cães, usadas por muitas revistas e empresas cinematográficas nacionais e internacionais, durante 14 anos supervisionou um Centro de Raças Raras, em 2007 ficou em segundo lugar e em 2009 ficou em primeiro lugar no prêmio do Concurso Anual de Redação apresentado pela Dog Writers’ Association of America, trabalhou na série de TV ‘Dogs which changed the World’ da Tigress Productions’, transmitida nos EUA e na Europa em 2007, e no influente programa de TV da Passionate Productions’s chamado ‘Pedigree Dogs Exposed’, transmitido pela BBC e contribuidor do Relatório Bateson sobre criação de cães com pedigree.

O Bull-Mastiff ou Big Bulldog

     A história mais antiga da raça de cão que hoje chamamos de Bullmastiff é basicamente descrita a partir do seu uso e desenvolvimento pelos gamekeepers como cães conhecidos por nightdogs, no entanto, essa descrição parece ignorar a existência de registros de um tipo canino considerado como “Bulldog Grande” ou “Mastiff Menor” e chamado por diversos nomes, incluindo “Gamekeeper Nightdog”, “Bull-Mastiff” e “Big Bulldog”. Então, existe uma grande possibilidade de que desde a muito tempo ocorressem esses cruzamentos e, portanto, a ocorrência de três tipos de molossos ingleses compartilhando um mesmo fluxo gênico, sendo o tipo intermediário o que viria a se tornar a base do famoso Nightdog e posteriormente um ancestral longínquo do Bullmastiff.

     Cães com a conformação e emprego do Bullmastiff, de fato, eram comuns na Grã- Bretanha do século XIX, mas já em 1785 havia referências desses animais. Embora, até tempos depois do conceito de raça ter surgido, esse tipo não recebeu o título de raça distinta e, portanto, nenhum reconhecimento, dessa maneira, diversos escritores britânicos produziram, espalharam e popularizaram distorções. A limitação do entendimento da história antiga da raça, se deve aos estudiosos do século XIX, referindo- se constantemente ao conceito de raça pura ao descrever a criação de cães de épocas anteriores, quando esse conceito não era praticado e muito menos buscado. É também preciso ter em mente que esses escritores do passado inglês tinham ínfimo ou nenhum contato fora dos do círculo de cães e criadores abastados dos campos de caça e tiro, desta forma, os cães populares raramente foram estudados de forma correta. Por isso autores como Richard Thornhill, em seu ‘The Shooting Directory de 1804, cita: “O Bull Dog com o Mastiff produz um vira-lata que é chamado de Strong Bull Dog, maior do que o real e que se aproxima mais dele do que o Mastim” e John Lawrence, em seu The Sportsman’s Repository de 1820, refere-se a um “Mastiff que pode ter uma ou duas gotas de sangue de Bull Dog”.

     Aparentemente, esses escritores não tinham o conhecimento para descrever três formas de molossos existentes em seu país, caminho percorrido ao contrário na Europa Continental, onde a maioria dos estudiosos eram mais precisos, por exemplo, sabiam e reconheciam as diferenças entre os cães chamados de bullenbeissers, tanto na aparência quanto no uso.

O Gamekeeper Nightdog

     Os gamekeepers ou os guarda-caças das propriedades particulares da nobreza, eram homens que costumavam ser tipos semelhantes em todos os locais da Inglaterra. Muitos foram banidos de suas próprias vilas por impedir a caça que em muitos casos era vital para a sobrevivência das famílias mais pobres. Havia ainda aqueles que buscavam sempre tomar o emprego de outro gamekeeper quando ocorria de um patrão possuir mais renda do que outro. E vários costumavam trabalhar sozinhos durante as noites, acompanhados apenas de seus cães, isso por não confiarem em subordinados que poderiam sair para caçar ao invés de fazer a ronda.

     Uma das principais atividades dos gamekeepers era impedir a ação de caçadores furtivos, que não eram todos pobres que se embrenhavam no mato para pegar um coelho para alimentar sua família faminta. Havia verdadeiras gangues organizadas de caçadores ilegais, com veados, coelhos e pássaros proporcionando uma venda lucrativa. O advento dos trens permitiu a formação de grupos maiores que eram especializados na caça furtiva e que operavam de modo altamente organizado e com bastante violência caso achassem necessário, não se importando em prejudicar o guarda-caça se considerassem preciso, tendo registro de grupos invadindo e atirando contra as casas dos senhores das propriedades. E com o advento e uso dos trens, permitiu que grupos maiores se formassem e mais distante explorassem, podendo ainda exigir os melhores preços dentro do mercado ilegal, uma vez que as ferrovias permitiam que eles se aventurassem e retornassem com a mercadoria mais fresca.

     Certamente, ser um gamekeeper era um modo de vida perigoso, mas que acabava por ter grande influência com os patrões, o que gerava bastante recursos para trabalharem o uso de cães no patrulhamento das reservas. O que estava sendo procurado naqueles tempos era um cão de trabalho, principalmente como companheiro de patrulha. Tal tarefa não seria adequada para um cão nervoso, barulhento e inquieto, mas sim para um cão poderoso, bem disciplinado e silencioso, capaz quando bem treinado, de andar exatamente ao lado de seu dono, de permanecer parado por muito tempo se preciso e de ignorar animais domésticos ou silvestres, para localizar caçadores na maioria das vezes armados e possivelmente escondidos ou entrincheirados, para em seguida derruba-los e detê-los sob comando, tendo ainda ter que seguir escoltando calma e atentamente. E o tipo de cão considerado ideal, já em meados do século XVIII, foi o intermediário entre o Mastiff e o Bulldog, pois pareciam combinar o melhor entre as raças de proteção conhecidas e disponíveis, sendo extremamente poderoso, de aparência formidável, razoavelmente veloz, ágil, confiável, leal, estável, tenaz, bravo e silencioso o suficiente para realizar a tarefa de perseguir e derrubar um caçador furtivo e mantê-lo assim até que o gamekeeper chegasse. “Pathfinder” em Breaking and Training Dogs de 1906 escreve: “Em muitas partes do país é costume que os guardas e vigias estejam acompanhados de nightdogs, são auxiliares úteis apenas se forem devidamente treinados … Normalmente, o Bull-Mastiff é a raça selecionada para este propósito, o rajado se possível”.

     Evidentemente, por vários e vários anos seguidos, foram utilizados e experimentados diversos tipos caninos em diferentes cruzamentos. Além do uso fundamental do Mastiff e do Bulldog, existem referências sobre o Dogue Alemão, como ocorreu com uma filha da cadela baixa e tigrada chamada Duchess do gamekeeper Crabtree, seu pai era um mastiff da linhagem Lion of the Bold Hall pertencente a Holdsworth e foi acasalada com Tiger of Waterton, um Dogue Alemão fulvo. O ícone Thorneywood Terror de W. Burton, veio de um amalgama de Mastiff X Bulldog X Bull Terrier X Dogue Alemão. Também foi utilizado o Cão de São João, parecido com o Labrador na função e na morfologia, mas um pouco mais molossóide, que era popular entre os gamekeepers do Sul e Sudeste da Inglaterra devido ao temperamento e as qualidades de nadador, já que não poucas vezes era necessário entrar na água para capturar o caçador ilegal. Vários ainda vieram da cruza do Mastiff com o Bloodhound, principalmente no sul do País de Gales, devido ao faro deste último. A famosa cadela Osmaston Turk era basicamente Mastiff com Bloodhound, embora com um pouco de Bulldog visando dar alguma “apimentada” no temperamento. O Dogue de Bordeaux e até mesmo o São Bernardo e o Golden Retriever que estava começando a se formar naquele período, foram envolvidos nesses cruzamentos.

     Os gamekeepers nightdogs possuíam um trabalho extremamente arriscado e que muitas vezes os levavam a uma morte prematura, ainda mais porque os caçadores capturados nas propriedades particulares se encontravam lutando por suas vidas. Ser preso por um gamekeeper significava pena de morte por enforcamento ou ser banido para alguma colônia, o que tornava estes homens desesperados, a captura não era uma opção. Houve mesmo cães que ficaram conhecidos por terem causado, de modo justificado e documentado, a morte de homens. Existe grandes chances de não poucas dessas mortes serem verdadeiras, pois com as mudanças penais na Inglaterra, a morte por cães quando se tratava de caçadores ilegais só ocorria em situações inevitáveis, se tornado cabível de processos legais e sanções, bem como requeria ao menos uma testemunha. Por isso os cães atuavam de focinheira, muitas delas com bolas de ferro na ponta, aumentando o impacto. Em The Gamekeeper at Home, escrito em 1879, Richard Jeffries relata um tipo de situação a que estes nightdogs podiam encontrar: “Na última patrulha (a do fidalgo) foram seis homens e um cão mastim, estando quatro armados e o cavalheiro portava uma forte clava. Eles voltaram-se contra uma gangue (caçadores furtivos) se dirigindo pela sombra. Com um grito os quatro ou cinco homens andando pela grama verde deslizaram para atrás das árvores e dois dispararam matando o cão mastim e ferindo um homem na perna”.

     Outros relatos dão conta da eficiência destes cães em diversas ações, veja-se alguns deles. Grantley Berkeley em Recollections – Poachers, de 1850: “O primeiro cachorro que pude chamar de meu foi um preto, um cruzamento de bull com mastiff… Seu nome era Grumbo… Vi as costas de um dos homens, sua figura parada, suas mãos erguidas acima da cabeça, e Grumbo, meu cão fiel e sagaz, um metro à frente dele, barrando seu caminho, deitado como um leão prestes a saltar, os olhos, não os dentes, fixos na garganta do sujeito. A ameaça foi suficiente, ele ficou aterrorizado… e nesta posição eu o agarrei pelo colarinho”. ‘Stonehenge’, escrevendo em seu Dogs of the British Isles de 1878, nos dá esta visão: “…provavelmente não há variedade de espécie que combine tanta força e poder e tanta docilidade e amabilidade, portanto ele é, por excelência, o cão do gamekeeper… todo mundo com experiência sabe que muitos gamekeeper nightdog, são metade Bull, estando perfeitamente sob controle mesmo com provocação severa…”. O General Hutchinson escreve em Dog Breaking de 1909: “A aparência formidável do animal e o conhecimento de seu poder impediram com mais eficácia o roubo de ovos do que os melhores esforços de um uma dúzia de observadores. Ele era o terror de todos os garotos ociosos da vizinhança. Cada rapaz tinha certeza de que, se uma vez que ‘Growler’ fosse colocado em seus passos, com certeza ele seria alcançado, derrubado e detido até a chegada do gamekeeper”.

     Do ponto de vista do gamekeeper, nenhum cão superava o Nightdog. Eles salvaram a vida de muitos desses guardas, executaram feitos impressionantes e eram, sem dúvida, considerados como inimigos pelo caçadores furtivos. Foram cães acostumados a observarem e a rastrearem qualquer intruso; era rápido em ação e isso combinado com sua imensa força lhes permitiu perseguir, derrubar e dominar qualquer homem com facilidade. Procurava-se minimizar o efeito das armas com os cães alcançando silenciosamente seus alvos, os surpreendendo e dando voz somente se precisassem informar seus donos sobre a localidade exata em que estavam com seus prisioneiros. Na época, dizia-se que os nightdogs eram capazes de manter uma pessoa abatida por horas e nunca relaxar sua vigilância até que o entregassem ao seu manejador. Mesmo assim, mantinham vigilância cuidadosa para ver se tudo estava bem e, ao menor sinal de resistência do caçador ao gamekeeper, o cão voltava a subjugar o infrator.

     Um Gamekeeper Nightdog, quando devidamente treinado, acompanhava seu tratador, quando sem guia e coleira tinham de se manter firmes e ignorar os animais silvestres e domésticos e deveria ser atlético para transpor todos os tipos de obstáculos, como cercas ou portões, especialmente na perseguição de um intruso. À noite, quando necessário, ficavam praticamente imóveis, se pudessem, escondidos nas moitas; mas, uma vez dado o sinal, eles entrariam em ação rapidamente. Ao trabalhar a distância, eles tinham que operar sob controle de voz, exercer discrição, ter um desempenho que além do seu treinamento deveria combinar com iniciativa própria, evitando agir somente por impulso, mas conseguindo avaliar a situação.

     Ainda sobre o que se considerava um Gamekeeper Nightdog ideal, temos diversos escritos, entre eles, registra Sr. W. Burton, o mais experiente treinador de cães de seu tempo: “O típico nightdog de Thorneywood não deve ser inferior a 80 libras e se tiver 100 libras e for apto e ágil, tanto melhor. Tem de ser tigrado escuro, com rajas largas para facilitar a ocultação durante a noite. Ele não deve temer nenhum homem ou grupo de homens, não importa quão sinistra seja a intenção. Ele deve ser capaz de enfrentar o bastão, o chicote e a espingarda com igual entusiasmo e não apresentar qualquer timidez ou medo com relação a estes. Uma vez envolvido com seu algoz ele deve pressionar ferozmente e lutar como um leão, sem nunca abandonar seu domínio, mesmo quando castigado ou se levado a morte. Mas sob minhas ordens ele deve ser obediente e fiel. Na minha casa ou em seu canil tem de ser tranquilo e de bom temperamento. Não existe cão melhor ou mais resistente do que um bom nightdog”.

     Outro relato interessante pode ser encontrado em Dogs Since de 1900 e escrito por Croxton Smith, que se refere a Segunda Guerra dos Bôeres: “Pouco antes da Segunda Guerra, eu li que muitos deles estavam empregados na guarda das minas de diamantes em Kimberley. Eram utilizados todas as noites cinquenta sentinelas ao redor de uma milha quadrada de cercas de arame farpado. Funcionou tanto que onde antes eram necessários cinquenta homens armados, passou a ser usado apenas quatro homens com cães”. “Wildfowler” em Training a Keeper’s Night Dog de 1915: “… é melhor ter um animal muito grande, cujo tamanho imponha imediato respeito e o rosnado por si só seja um tanto atemorizante, porém se não for o suficiente, o cão deve ter disposição e ser capaz de investir num aceno de seu mestre, se necessário, aceitando a própria morte, quando chamado para protege-lo”. Mesmo a polícia encontrou nestes cães um grande valor e usaram-no como companheiros de patrulhas e guardas de armazéns e docas, como cita o Sgt. Cordy da polícia de Walsingham, Norfolk em 1932: “Pessoalmente, não vejo cão melhor do que o Bullmastiff para o trabalho da polícia e eu estou pronto para apoiá- lo contra qualquer raça. Pode interessá-lo saber que fiz uma oferta para um de meus camaradas que é um alsacianista para treinar um Bullmastiff contra um Alsaciano, ambos devendo seguir a trilha do modo mais estável. Eu vou fazer tudo o que estiver ao meu alcance para promover esta grande raça totalmente inglesa. Eu tenho provado o quanto é destemida e fiel. Foi um amigo gamekeeper que me recomendou e disse que eu nunca iria me arrepender de ter um. Suas palavras eram verdadeiras”.

     Para colocar mais registros de como esses cães eram vistos pelos ingleses, Robert Leighton, principal escritor cinófilo de sua época, coloca em seu livro The Complete Book of the Dog de 1922: “… o mais popular de todos os mestiços, como um cão de guarda é o Bull-Mastiff, que é quase digno de ser considerado como uma raça distinta”.

O Bullmastiff aparece

     Em 1871 durante a exposição realizada no Crystal Palace houve seis inscrições de cães intitulados como “Yard or Keeper’s Night Dogs”. Oito anos depois, “Stonehenge” estava escrevendo em seu The Dog in Health and Illness: “O buldogue como guarda é inigualável, exceto talvez pelo Bull-Mastiff, um cruzamento direto dele”. E James Watson em seu The Dog Book de 1906, referiu-se: “Outro antigo criador de mastins para uso dos gamekeepers foi John Crabtree, que enquanto fazia suas rondas, encontrou uma cadela mastim tigrado longa e baixa em uma armadilha. ..ela veio de Lancashire, e Crabtree sempre disse que ela tinha sangue de buldogue”.

     Em seu The Complete Book of the Dog de 1922, uma das mais famosas autoridades caninas, Robert Leighton, estava registrando: “…o mais popular de todos os mestiços, como cão de guarda, é o Bull Mastiff, que é quase digno de ser chamado de uma raça distinta”.

     A imensa bravura e ousadia do Bullmastiff foi reconhecida cedo até pelo maior especialista de sua época em cães de guarda, também famoso por não ser dado a elogios generosos, o tenente-coronel E. H. Richardson, em seu Watchdogs de 1924: “O bullmastiff, embora não seja tão grande, também pode ser muito veemente para objetivos comuns e precisa de um homem para controlá-lo. No entanto, ele tem sua utilidade quando um homem se depara com uma situação excepcionalmente perigosa e solitária em casa ou no exterior. Absolutamente destemido no ataque e com sua reputação por si só carregando valor agregado, esta é uma raça excelente para circunstâncias especiais”.

     Mas, como pode ser visto, o fato de o Gamekeeper Nightdog se tornar considerado em toda a Grã-Bretanha como um tipo distinto de cão foi um avanço significativo, no entanto, não devendo ser mal interpretado por aqueles que persistem na noção de que a raça foi de alguma forma inventada como um inspiração de ingleses antigos. Assim, o nome Bullmastiff e o reconhecimento como raça se deu somente em 1924, quando o Kennel Club deu o seu aval oficial, em 1925 é registrado o Midland Bull-Mastiff Club e em 1926 aparece o National Bullmastiff Police Dog Club. Entre os criadores pioneiros incluem J. H. Biggs de Osmaston Hall em Derbyshire, W. Burton de Burtonwood em Nottingham (proprietário de alguns cães icônicos e treinador de referência), J. H. Barrowcliffe (mais tarde presidente do Midland Bull-Mastiff Club), H.E.V. Toney, V.J. Smith, J. Barnard e S. E. Moseley (que viria a ter um papel ao mesmo tempo significativo e controverso na raça).

O papel de S. E. Moseley

     A fórmula conhecida na atualidade foi estabelecida por S. E. Moseley que procurou estabelecer cães apenas com a utilização de raças britânicas cuidadosamente selecionadas e somente com a sua base mais popular e mais inglesa, o Mastiff e o Bulldog.

     Moseley foi proprietário do Canil Farcroft e posteriormente assumiu o papel de liderança no desenvolvimento da raça. Tinha preferência por cães de estatura mediana, chegando a entender que cães com mais de 68,5 centímetros perdiam em rapidez e agilidade, além de terem menos resistência e habilidade para usarem seus corpos para dominar um homem, sua definição era admirável: “Farcrofts são o que os bullmastiffs devem ser – fiéis e destemidos, mas não ferozes. Grandes o suficiente para serem poderosos, mas não grandes demais para deterem poder em excesso”.

O modelo de seleção de Moseley seleção foi o seguinte:
• F1 – Cruzando uma fêmea de Mastiff com um macho de Bulldog para se obter um 50M/50B%;
• F2 – Em seguida foi utilizada uma fêmea da ninhada 50/50% com um Mastiff puro macho dando um 75M/25B%;
• F3 – Depois foi acasalado uma das fêmeas 75/25% com um macho F1 gerando cães 62,5M/37,5B;
• F4 – Nesta etapa foi feito um cruzamento entre uma fêmea 62,5/37,5% com um macho F1;
• F5 – Uma fêmea 56,25M/43,75B% com um macho F4; F6 – O resultado obtido seria um cão tendo aproximadamente 60% Mastiff Inglês e 40% Bulldog Inglês.

     Por conta disto, Moseley é visto como o fundador do Bullmastiff como raça e qualquer cão pode ter seu pedigree rastreado até os cães de seu canil, o Farcroft. Sua cadela Farcroft Silvo e seu cão Farcroft Fidelity foram os primeiros exemplares da raça a se tornarem campeões de exposição. Inclusive o já comentado Robert Leighton dizia sobre Fidelity: “Ativo como um terrier, com os quartos traseiros que não iriam decepcionar um alsaciano”. Lembrando que alsaciano era como se chamava o Pastor Alemão na época.

     Entretanto, em 1925, Moseley, que também criava Mastiff Inglês, foi considerado culpado pelo KC por condutas que prejudicavam aos interessados em assuntos caninos e por conta disso foi censurado. Em um livro, ele tentou fazer passar a ilustração de um Mastim como sendo seu Bullmastiff chamado Farcroft Formidable, ainda forneceu pedigrees incorretos e obteve um filhote de Pastor Alemão por meio de engano.

     Ele era um criador influente, mas não confiável, não se podendo dar credibilidade a precisão de seus pedigrees. Sua famosa fórmula não faz muito sentido geneticamente, pois a porcentagem apresenta uma precisão que não era possível de ser prescrita, devido a isso a suspeita atual é que o Sr. Moseley procriou com base no fenótipo até que, por tentativa e erro, obteve consistentemente seu tipo de cão. Outra pista que vem somar, é o fato de que todos os criadores influenciados por seus escritos genealógicos não obtiveram sucesso ao repetir a fórmula. Ademais, sabe-se que ele chegou a montar vários pedigrees falsos, registrado mastiffs leves como bullmastiffs ou inventando-os completamente. De qualquer forma a longa trilha percorrida pelo Bullmastiff não pode deixar de passar por S. E. Moseley e o canil Farcroft.

A velha bagunça dos pedigrees

     Desde o início da cinofilia moderna, houve bagunça dos registros e com o Bullmastiff não foi diferente. Além dos cães de Moseley, muitos outros tiveram pedigree como Mastiff Inglês e como Bullmastiff, que obviamente produziram descendentes que foram parar na genealogia de outros cães que também tinham certificado de raça pura. Por exemplo, baseado em dados divulgados no Kennel Gazette da Grã-Bretanha, em 1901, a cadela chamada Clifton Lass, pertencente ao Sr. John Fox, foi registrada como Mastiff Inglês nascida em 1894. Em 1903, o Sr. Fox registrou Clifton Terror e Clifton Hall como Mastiffs, vindos de Clifton Lass por Thorneywood Terror, também registrado como Bullmastiff. Em 1905, o Sr. W Blackburn registrou Ratcher Hill Bessle como mastiff, novamente de Clifton Lass por Thorneywood Terror. Em 1912 o Sr. C Richardson registrou dois bullmastiffs, Grip em 1907 e Diamond nascido em 1911, ambos de um acasalamento entre Thorneywood Terror e Clifton Lass. Ou seja, Clifton Lass deu à luz a Diamond quando tinha 17 anos, o que realmente não é muito provável. Esse Thorneywood Terror era considerado o nightdog mais eficaz da Grã-Bretanha, dando demonstrações de captura de homens em feiras por todo o país, era tigrado, com evidente sangue bulldog e um Bullmastiff prototípico. Ele foi amplamente utilizado como pai de mastiffs como Stanford Busker (nascido em 20 de julho de 1902) e Allestree Judy (nascida em agosto de 1902).

     Cães como King Baldur e Penkhill Lady aparecem como o mesmo pai e mãe nos registros de Mastiff Inglês e de Bullmastiff. O primeiro Bullmastiff a ganhar um prêmio em Crufts, o influente Farcroft Fidelity, dito ser filho de Shireland Vindictive era, na verdade, filho de um Bulldog chamado Wellington Marquis.

     Não houve advertências sobre os acasalamentos em uma época em que os cruzamentos eram registrados regularmente, embora, às vezes, exista mérito em cruzar duas raças na busca por maior função ou virilidade, mas registros falsos não ajudam nenhuma raça. Esses são inúteis, zombando não apenas do sistema que ainda hoje é perpetuado, mas também de todo exame meticuloso dos registros de reprodução.

Considerações

     Os criadores de Bullmastiff de hoje devem muito aos devotos conhecidos e desconhecidos que perpetuaram esta raça esplêndida. Aqueles com méritos devem ser honrados com um trabalho de criação que os fariam ficar admirados. Animais fisicamente e mentalmente saudáveis e verdadeiramente funcionais. A busca pelo sucesso nas exposições, apesar de legitima, nunca deve ser o único objetivo. Criar principalmente cães premiados, dando pouca ou nenhuma consideração a construção familiar é algo problemático.

     De toda maneira, a longa trilha do Big Bulldog, depois do Gamekeeper Nightdog até ao Bullmastiff é a história notável de como a criação de cães igualmente notáveis pode continuar por séculos.

A HISTÓRIA DO BULLMASTIFF PARTE II – O TREINAMENTO DOS NIGHTDOGS

     As informações sobre o histórico e as ideias de treinamento dos nightdogs possuem como principal fonte os testemunhos dados por William R. Koehler que serviu durante a Segunda Guerra Mundial como treinador principal no War Dog Training Center, na Califórnia, depois tornou-se treinador-chefe do Orange Empire Dog Club, na época o maior clube canino dos Estados Unidos, foi instrutor de vários clubes de raça, também foi treinador de cães do Walt Disney Studios por muitos anos e autor de alguns livros sobre adestramento de cães, com o primeiro sendo lançado em 1962, chamado The Koehler Method of Dog Training, onde expõe sua metodologia de adestramento. Outra fonte são o já referido David Hancock, bem como documentos da época.

O treinamento dos gamekeepers nightdogs 

     Sobre o treino, embora não houvesse um método unificado, a maioria era de estilo policial e de cães de caça de finais do século XIX e início do século XX, ou seja, os cães recebiam treinamento com métodos que ajudaram a definir o que, por exemplo, hoje chamamos de Schutzhund e de KNPV. Existiam provas de desempenho e obediência que costumavam seguir o padrão estabelecido para a seleção de Airedale Terrier, ainda que fosse uma raça muito menor. Inclusive os cães do já citado W. Burton, embora não facilmente disponíveis, chegavam a ser mais estimados do que os pastores alemães da época, com essa fama tendo durado até a década de 1920, quando a sua linhagem praticamente desapareceu como efeito da Primeira Guerra Mundial e com as mudanças políticas-sociais que passaram a vigorar na Inglaterra. Em verdade, esses efeitos se estenderam para praticamente toda a população de Gamekeeper Nightdog.

     As provas de agilidade e obediência incluíam escalar paredes, saltar valas, entrar em rios ou lagos para recuperar algum objeto quando ordenado, muito parecido com a recuperação feita por cães de caça e tiro. Mas ao contrário das provas modernas que são conduzidas em áreas delimitadas, na época esses testes podiam ocorrer em todo tipo de lugar, com grama alta, árvores, pessoas disparando armas ou apenas passando por ali e com rebanhos pastando nas proximidades. As barreiras de escalada poderiam ser paredes de pedra ou qualquer outra coisa que servisse de obstáculo, como, por exemplo, portões de ferro. Tudo isso acabava auxiliando na averiguação da estabilidade dos nervos.

     O controle direcional também era exaustivamente praticado e conduzido de maneira similar ao dos cães de caça e tiro, feito para apontar caçadores furtivos e outros alvos semelhantes. Também era esperado que realizassem manobras de cães militares, como entrarem em valas com seus manejadores, sendo o exercício noturno uma das principais atividades, pois era um dos principais momentos de atuação real. Também era exigido que permanecessem totalmente alertas e focados. Um dos testes feitos tendo em vista o controle e o senso de direção era o de cobrir os olhos dos cães para evitar estímulos, em seguida um homem se aproximava com alguns metros de distância, mas na direção do vento. O esperado era que os cães detectassem a aproximação, alertando de modo silencioso e contundente, para depois ser liberado para imobilizar o homem.

     O treino de luta tinha características exigentes. No trabalho, estava incluso, ainda que pouco, formas antigas ou improvisadas de materiais para a mordida, entre tanto, o uso da focinheira era extensivo. Utilizava-se roupas de juta com duas ou três camadas, embora houvesse aqueles que enrolavam um ou dois jornais nos braços e nas pernas no intento de oferecer uma proteção mínima e com maior realidade para os cães. Assim equipados, os ajudantes eram instruídos a confrontarem os cães da maneira que mais lhes parecesse conveniente.

     Os shows organizados pelos gamekeepers estiveram entre as primeiras apresentações caninas e nelas ocorriam a apresentação de conformação, porém, tal era encarada apenas como uma parte da função que deveriam exercer, já que permitia avaliação prática do que seria a melhor estrutura, mas o objetivo completo incluía demonstrar controle e desempenho. Uma característica dos testes feitos nos nightdogs era de que não havia pontuação, de modo que tudo girava em torno de ser apenas aprovado ou reprovado. As classificações dos juízes mais valorizadas eram “Pronunciado”, “Mérito” e “Distinto”. Um cão até poderia ser uma imagem perfeita de estrutura, mas se faltasse convicção no temperamento ele seria visto no máximo como mediano. Desse modo, a prática de provas permitia que os criadores fizessem melhorias dentro de suas seleções, uma vez que facilitava a identificação dos cães de melhor qualidade.

Carta publicada em 1905, que apresenta uma longa descrição de como os cães podiam ser treinados

     Frank Townsend Barton MRCVS, para o Sr. W. Burton do Thornewoods Kennels, Nottinhghan, estou em débito pela seguinte carta.

     Um nightdog perfeitamente treinado e confiável é tão útil para o gamekeeper como dois ou três assistentes, de fato, tenho ouvido pessoalmente que os caçadores preferem enfrentar uma dúzia de homens, mesmo tendo de oferecer resistência contra todos, do que metade desse número acompanhado por um desses animais. Se este é o caso, é uma maravilha, porém os nightdogs já não são mais utilizados com frequência pelos gamekeepers em localidades difíceis, por isso temo que estes cães caiam em descrédito pela forma despreparada como veem estão sendo empregados por manejadores descuidados. Afinal não se deve supor que basta colocar uma focinheira num nightdog adulto para que ele simplesmente saiba tudo o que tem de fazer em combate. O cão tem de ser treinado em sua função do mesmo modo que se deve ensinar um retriever a recuperar a caça ou ele nunca vai se mostrar um parceiro satisfatório quando caçadores furtivos forem localizados.

     Ao conseguir um filhote, ele deve ser acostumado a utilizar focinheira desde a mais tenra idade – cinco meses por exemplo – e com relação a estranhos, nunca deve ser permitido que estes brinquem ou o acariciem, mas por outro lado, podem provoca-lo à vontade, desde que não o machuquem. De todos os modelos, a minha focinheira preferida é aquela que possui um pedaço firme de couro por de baixo da mandíbula e que possui tiras em volta do pescoço e nariz, acompanhada de fivelas, pois facilita a manipulação conforme a necessidade.

     Assim que o cão atingir os dez meses e já estiver bem habituado a focinheira, ele deve ser levado amordaçado para um lugar calmo, onde um figurante desconhecido que você arranjou já está aguardando. Este homem tem de estar segurando uma bolsa numa das mãos e utilizando uma luva de boxe na outra, permanecer escondido no local designado e quando o cão e seu mestre ficarem por volta de noventa metros ou mais, o figurante deve sair de seu esconderijo e correr pelo campo. O cão de uma só vez deve ser liberado e encorajado a atacar o homem, com seu proprietário correndo com ele por toda a perseguição. Tão logo o cão alcance sua “presa”, o figurante tem como dever lhe golpear com a bolsa, dar socos em seu flanco e puxar sua cauda, provocá-lo de modo geral. No entanto, não permita que isto continue por muito tempo sem alguma pausa, um cão amordaçado perde seu fôlego logo. Por isso, seu mestre deve chegar ao local do confronto o mais rápido possível, depois de incentivar um pouco o cão, terá de retirá-lo e afrouxar a focinheira, assim que der um ligeiro descanso, o cão pode repetir a partida como fez antes.

     No período em que o cão começar a mostrar desejo por entrar em luta, o figurante pode utilizar um bastão e ser instruído a dar-lhe um ou dois golpes rápidos, mas neste momento deve ser tomado muito cuidado e também se tem de observar os efeitos. Alguns cães embora capazes de lutar até o final, são tímidos e sensíveis, de modo que um golpe com a vara pode causar hesitação, não por medo do golpe em si, mas por uma impressão de terem sido castigados por algo que tenham feito de errado. Caso isso ocorra, o uso do bastão deve ser dispensado por um tempo e reintroduzido no futuro em diversificação de graus, se feito da maneira correta, logo o cão passa a confronta-lo com ímpeto e agressividade. Tenho visto filhotes da mesma ninhada variar muito no desenvolvimento da coragem, alguns são capazes de suportar vários golpes de bastão com um ano de idade, enquanto outros só serão capazes de enfrentá-lo seis meses mais tarde.

     Houve uma situação em que eu me deparei a um tempo atrás. Um gamekeeper tinha um cão jovem que eu arrumei para ele e dezoito meses mais tarde ele me relatou que não era um bom cão. Fiquei surpreso e perguntei se ele havia trabalhado exaustivamente a criatura. “Sim!” Disse ele, “eu tenho um observador para supervisionar o parque e eu liberei o cão nele. Ele foi bem, mas quando recebeu o golpe com a vara, voltou para mim e eu atirei nele”. Este mesmo homem sabia que eu havia mantido um cão desta mesma ninhada e me perguntou como ele estava progredindo. Então arranjei um modo dele vir me visitar e ver como se trabalha um cão, ele ficou muito surpreso com o que testemunhou. Em seguida eu expliquei que os cães que executam este tipo de trabalho precisam de formação, mas o meu amigo afirmou o contrário, dizendo que nenhum tipo de treinamento deve ser necessário.

     Em nenhum caso o cão deve ser treinado preso na corda, ou o resultado será o de que ele não irá perseguir homem nenhum. Em vez disso, ele só avançará no caçador quando este estiver perto e em seguida vai olhar para seu dono. O cão tem de ser ensinado a confiar em si mesmo. Alguns gamekeepers utilizam uma corda longa e mantêm seus cães religiosamente presos até o momento final, a razão disso eu nunca poderei entender, a não ser a de manter o animal próximo para a sua própria proteção pessoal. Se assim for, o cão não está sendo posto em sua função real.

     O nightdog é mais valioso para capturar um homem do que para especificamente lutar contra um, mas ainda assim ele deve ser ensinado como lutar, porque é o amor pelo combate que irá fazê-lo perseguir. Obviamente que um cão é muito útil quando uma luta áspera acontece, porém ele age desse modo duplo somente depois de ter havido primeiro uma longa perseguição contra os caçadores e é somente depois que ele salta num homem é que ele será obrigado a derrubá-lo. Além disso, se um cão se recusa a perseguir um homem, ele não será bom no caso de um grupo que comece a arremessar pedras e nesses casos um animal resoluto é sempre bem-vindo. As chances reais de um cão ser atingido por uma pedra são de dez para um e se ele já está perto, nenhuma pedra poderá ser arremessada por medo de que um dos camaradas seja atingido e enquanto o animal está ocupado com um dos membros do grupo, os outros terão muito trabalho para evitar os avanços do cão no companheiro caído, no entanto, isso permitirá que o grupo tenha tempo para atirar nos guardas que agora devem acelerar para entrar na luta.

     Para entender melhor, suponha que um cão quando liberado avança sobre um homem e não mostra medo nenhum do bastão, ele deve então ser ensinado a manter o ataque e não dar um ou dois saltos e depois voltar, permitindo que seu adversário tenha oportunidade de escapar. Como um meio de realizar tal coisa, o proprietário do cão deve se manter o mais próximo possível dele e incentivá-lo a sustentar a luta. Entretanto, se tirar o cão do enfrentamento somente após perceber claramente que o cão está ficando sem fôlego, a probabilidade é de que este vai ficar parado e como o homem instintivamente faz a mesma coisa, ele vai regressar para seu mestre, talvez achando que tenha cumprido com seu dever. Uma vez que este hábito é adquirido, será necessária alguma paciência para corrigi-lo. É uma regra de ouro nunca esgotar um cão jovem sem necessidade, assim conforme for avançando em idade ele será capaz de lutar por um dia inteiro.

     Tendo progredido até agora, o cão deve passar para a próxima fase de treino, que consiste em encontrar um homem escondido numa vala ou em cima de uma árvore. Sinceramente, esta é uma tarefa um tanto difícil e não são todos os nightdogs que desenvolvem alguma inteligência neste quesito. Para começar, se deve instruir o homem a se manter numa vala em uma de suas extremidades, tendo o cuidado para que o vento esteja a favor do cão e em nove a cada dez casos será possível perceber que o cão olha como se estivesse procurando alguém. E deve-se ir incentivando o animal a seguir em frente conforme ele vai se movendo na direção da pessoa escondida. Ao chegarem perto da vala, o cão vai detectar muito fortemente o cheiro de sua “presa” e neste momento o figurante deve fazer um ligeiro movimento com a intenção de atrair a atenção do animal. Este movimento deve ser repetido até que se descubra o local do esconderijo, sendo ensinado assim a rastrear, o cão se torna rapidamente hábil em encontrar caçadores furtivos que tentam se esconder.

     Tanto quanto isto é certo, não existe afirmação de que um homem pode despistar seu rastro com a vantagem de alguns minutos, se o cão é colocado sobre a trilha, o homem será seguido. Alguns bull-mastiffs podem se tornar muito capazes para alcançar o homem, no entanto, estudos recentes têm demonstrado que até mesmo o Bloodhound de alta linhagem tem de possuir treinamento antes de infalivelmente caçar um homem nestas condições.

     Outra coisa importante a ser mostrada para um nightdog é que ele pode e deve deixar o homem que ele derrubou e investir em outro enquanto o primeiro já está sendo dominado pelos gamekeepers. Suponha que os guardas carreguem contra meia dúzia de caçadores furtivos, de um salto eles se levantariam e fugiriam, com os caçadores não capturados ficando em vantagem e com a quase certeza de escaparem se o cão não é competente para desempenhar seu papel. Mas se ele é capaz, prontamente ele perseguirá de perto e assim que conseguir fará uma carga contra um dos homens e o manterá no chão, ele então deve ser encorajado a investir contra outro caçador da mesma forma e assim por diante até que todos tenham sido presos.

     Para ensinar um cão a fazer isso, será necessário o uso de dois figurantes que devem permanecer juntos e munidos de bastão e quando eles estiverem correndo, solte o cão e siga-o com explicado anteriormente. Quando o cão se aproximar, os dois figurantes devem se separar e ele vai delimitar sua atenção para um deles, assim que ele atacar o primeiro homem, este deve vir para baixo e ficar completamente imóvel, então o cão deve ser levado a atacar o segundo que nesta altura estará a uma boa distância. De início, o cão vai claramente preferir ficar focado naquele que conseguiu derrotar no começo do exercício ao invés de ir buscar uma nova chance de glória, mas persevere com ele até que renove a perseguição sem qualquer hesitação. Você conseguirá um melhor resultado nesse caso ao não permitir que o segundo figurante fique muito longe e é aconselhável que este acene com o bastão e de outras formas tente atrair a atenção do cão fazendo um convite para o ataque. Assim que o cão compreende o que lhe está sendo exigido, vá aos poucos aumentando a distância entre os dois homens, ou deixe que ambos corram em direções opostas.

     Também é extremamente importante ensinar o cão a respeitar os amigos, ou seja, atacar somente aqueles a quem é ordenado e após o feito não vir a fazer mais nada. Se ele não conseguir aprender isto é bem provável que não vá para cima daquele que não lhe chame a atenção. Assim que um cão se torna suficientemente trabalhado e provado que ele é um animal de alta qualidade em todos os sentidos, se torna bastante aconselhável permitir que o figurante que ele vem enfrentando sentar-se ao seu lado e esforçar-se para permanecer ao lado de seu oponente de quatro patas. Nem todos os cães vão consentir uma aproximação agradável neste ponto, mas a maioria geralmente se acalma e permanece quieto quando entendem bem que este é o comportamento esperado. É necessário que o cão reconheça que tenha cumprido seu papel após uma longa batalha, ele deve ficar quieto, ou seria estranho, para dizer o mínimo, se um gamekeeper tem de digladiar para afastar o animal de um caçador capturado, um mais ousado e malandro se aproveitaria do esgotamento dos dois para escapar.

     Um nightdog não deve nunca, sob nenhuma circunstância, ser atiçado por uma pessoa que no futuro terá de acompanhar o animal. Se assim for é quase certo que o cão fará sua carga contra esta pessoa quando inserido num embate contra caçadores. Tem ocorrido vários casos como este, em alguns deles o cão tinha sido avaliado pela pessoa quando ainda era filhote. Isto prova que eles não esquecem com facilidade a identidade do adversário.

     Há uma outra coisa que um cão deve aprender, para além de ter adquirido entendimento das aulas mencionadas anteriormente, para que possa ser considerado o nightdog perfeito. Quando deitado em campo com um grupo de guardas, não deve ser permitido que este adquira a mania de se enrolar e dormir como um porco gordo. Mas deve ser mostrado para ele que tem de permanecer atendo para a vinda de caçadores ilegais, utilizando seus sentidos naturais de audição e olfato para os detectar muito antes que possam ser vistos em cena e sejam identificados pelos sentidos humanos. Alguns cães fazem isso naturalmente, o restante só precisa de um incentivo para que se tornem observadores proficientes. Se um jovem cão manifesta a tendência de adormecer pesado quando em campo, peça para que um homem vá até o local onde o cão está dormente. Este indivíduo terá de se mover muito cautelosamente, tanto quanto consiga e ir direto para o cão se lançando intensamente sobre ele. Isto deve ser repetido com intervalos e em breve o cão passará a ficar atendo, esperando cada som para anunciar a chegada do antagonista.

     Também nunca permita que um nightdog persiga coelhos, se ele ganha permissão para fazer isso, a movimentação do pequeno animal irá sempre monopolizar a sua atenção e os gamekeepers nunca poderão ter certeza se ele levanta as orelhas com o farfalhar de um coelho sobre folhas mortas ou se é para a chegada de caçadores; quando colocado em perseguição ou luta é mais provável que dirija sua atenção para uma atividade menos útil.

     As opiniões têm variado sobre o peso que um nightdog deve alcançar, no entanto, um cão pequeno, não importa o quão perseverante seja, não terá a mesma eficácia como aquele que é grande, tenaz e ativo. Suponha que um cão de 50 ou 60 libras salte num homem, este último não poderia ser derrubado. Um caçador inteligente esperaria pela oportunidade, dominaria o animal com seus braços e o arremessaria contra algo que esteja em volta, bem ciente de que o cão não consegue saltar para trás. Um nightdog não deve ser inferior a 80 libras, se ele pesa 100 libras e for forte e ativo, tanto melhor. Ele deve ser capaz de saltar um portão com facilidade e atingir o solo em bom ritmo. Com relação a cor, o tigrado é preferível, pois não é facilmente visível durante a noite como é o vermelho e o castanho, ou mesmo um cão preto.

     Quando um cão perfeito for comprado ou treinado, todos os cuidados devem ser tomados para que ele seja utilizado corretamente. Ele só deve ser permitido morder um homem quando for absolutamente necessário e em seguida tem de ser firmemente amordaçado. Se um caçador se desespera e entra numa luta pela vida, os observadores devem utilizar o critério próprio quanto a dar a liberdade para que o cão morda. Se a focinheira for retirada, certamente o homem atacado irá ser marcado de tal forma que ele vai ser facilmente identificado. Para escapar de um nightdog tem rapazes que agridem até com cogumelos e amoras, este é o cumulo da loucura desenfreada devido ao grau dos ferimentos e terror a que podem chegar. Lembre-se de que é melhor não perder o cão, se um homem pode ser capturado sem mordidas, o cão deve permanecer amordaçado, exceto nos casos extremos. Um caçador que teve suas roupas rasgadas e foi mordido por simplesmente ter fugido, quando levado aos magistrados pode evocar a piedade destes, embora de coração mereça a condenação de seus juízes, além disso uma ação civil por danos pode vir a acontecer.

     É por se esquecerem completamente destas regras que tantos senhores se opõem aos nightdogs que estão sendo utilizados em suas propriedades. Mas se um animal deste tipo é considerado em sua forma correta e não for abusado, sua mera presença vai fazer mais para deter caçadores furtivos do que o emprego de meia dúzia de mãos extras.

Relatos de aptidão

     Sobre o cão Thorneywood Terror de W. Burton: Pesando em torno de 40 quilos. Foi considerado o Bullmastiff mais bem-sucedido de toda a história da raça, segundo consta, ele viajava através da Inglaterra com seu dono, o Sr. Burton do Thorneywood Kennel, fazendo demonstrações em provas de trabalho e nunca falhou nestas apresentações, o que aliás rendeu um bom dinheiro para a época.

     Uma impressionante apresentação aconteceu na data do dia 20 de agosto de 1901, quando o Sr. Burton o levou no Crystal Palace, não para participar da exposição que ali ocorria, mas oferecendo uma libra para qualquer pessoa que conseguisse escapar de seu cão que estaria de focinheira. Quem se prontificou a aceitar o desafio, para assim divertir um grande grupo de desportistas que havia se reunido no local, foi um expectador jovem e atlético, com seus 90 quilos e que já tinha experiência em lidar com cães.

     Foi delimitada uma área que se o homem cruzasse sem que o cão o alcançasse ele sairia como vencedor e também lhe foi entregue um bastão de bétula com 3 cm de espessura e de 2,5 de comprimento. O rapaz ganhou ainda uma vantagem de 10 minutos para longe do cão.

     Quando liberado o animal partiu atrás do homem, o pegou e o derrubou imediatamente no primeiro salto. O homem tentou bravamente voltar a ficar de pé, mas caia toda vez que conseguia se erguer, em última instancia foi mantido no chão até que o proprietário do cão o liberou. Esta pessoa e o poderoso canino participaram de três rodadas, mas o homem acabou derrotado em todos os turnos e foi incapaz de escapar.

     Sobre o cão Lion de Charles Peirce: Na primeira metade do século XX, um veterinário de Londres, Charles Peirce, encorajava seus bullmastiffs com focinheira a colocar para baixo qualquer homem sob comando. O mais reconhecido bullmastiff de Peirce era um cão tigrado chamado Lion, descendente de uma famosa nightdog chamada Osmaston Viper.

     Peirce tinha um ringue em seu quintal e apostava contra qualquer homem se este conseguiria permanecer de pé por cinco minutos ao enfrentar Lion dentro do ringue. O cão nunca perdeu uma aposta para seu dono, apesar de muitos terem tentado. Esse mesmo cão nunca fez mal aos seus “adversários”, apenas colocava-os para baixo e os mantinha ali até que fosse ordenado que os libertasse.

     Sobre uma cadela do Sr. Biggs: O Sr. Biggs foi o famoso proprietário do Canil Osmaston, entre os séculos XIX e XX. Ele já era um homem idoso quando foi atacado por caçadores furtivos durante a noite. Foi uma luta corpo a corpo desesperada no chão em defesa da própria vida. A cadela que o acompanhava, embora tivesse sido terrivelmente derrubada, conseguiu superar os três caçadores furtivos no final e durante toda a luta, quando tinha que passar por cima do corpo de seu mestre, era tão delicada como um cordeiro.

     Sobre alguns cães do Sr. Bennett: Quando o Sr. Bennett era um menino, num passeio, ele e sua irmã mais nova, foram perturbados por um vagabundo. “Cuidado com ele, Dick”, disse o jovem Bennett ao cachorro. Nesse momento, o cão na pressa para chegar ao homem, acabou derrubando a irmã em um riacho raso, ele então voltou, puxou a menina e depois segurou o vagabundo até que as crianças voltassem para casa e assim permaneceu segurando-o até o Sr. Bennett pai chegou.

     Em outra ocasião, quando seus pais estavam fora, tanto o menino Bennett quanto a sua irmã estavam brincando no corredor com um cavalo de balanço, quando um homem tentou forçar a entrada pela porta da frente e acabou empurrando-a um pouco, dizendo que lá esperaria a volta dos adultos. Foi então que um dos empregados da casa soltou um dos bullmastiffs. O cachorro manteve o homem no corredor das 9 horas daquela noite até as 3 horas da manhã seguinte, quando os pais voltaram da festa a que haviam comparecido. As crianças permaneceram sentadas nos cobertores, com medo de dormir. Nenhuma pessoa, nem o pequeno casal, conseguiu tirar o cachorro de seu intento, por mais que falassem com carinho e oferecessem comida. Ninguém ali se atrevia a fechar a porta, então o vento e a neve entravam, enquanto o homem gritava e prometia que iria embora. Quando o Sr. Bennett pai chegou, metade do homem estava entorpecida pelo frio e ainda assim o cachorro “aguentou tudo”, segurando o intruso. A polícia foi chamada, e o “cavalheiro” em questão foi identificado como um notório arrombador de casas, sendo dispensado de seu revólver e preso.

A HISTÓRIA DO BULLMASTIFF PARTE III – O PADRÃO DA RAÇA

     Artigo interpretando funcionalmente o até então padrão estabelecido para o Bullmastiff pela AKC (American Kennel Club). Esse artigo foi escrito por Carol Beans, criadora da raça por mais de 50 anos, proprietária do canil Tauralan Bullmastiffs, já exerceu o cargo de chefe do Comitê de Educação de Juízes da American Bullmastiff Association e foi atuante no conselho do clube por mais de 13 anos. Foi juíza da raça em nível de campeonato na Inglaterra e no Canadá, julgou a especializada nacional da ABA e teve o melhor Bullmastiff (dentre todos os sistemas) em 2001, 2003, 2006 e 2007.

     O Bullmastiff é uma raça de trabalho. Isso torna a afirmação “a forma segue a função” de extrema importância. Todos os cães foram desenvolvidos com um propósito. Por mais atraente que seja um animal, se ele não consegue fazer o que foi desenvolvido para fazer, é um péssimo exemplar da raça.

     Aqueles que vieram a ser os ancestrais da raça, foram desenvolvidos para ajudar os gamekeepers na Inglaterra a livrar grandes propriedades de caçadores furtivos e seus cães de caça. Esses caçadores não eram todos, certamente, pobres almas que capturavam um coelho para alimentar sua família faminta, havia gangues organizadas que não se importavam em ferir o gamekeepers, caso se vissem impedidas de seus intentos.

     Assim, chegamos à estrutura descrita no padrão atual do Bullmastiff. O cão em seu aspecto geral é ligeiramente mais longo do que alto na cernelha. As costas devem ser curtas. Deve haver um ligeiro arco sobre o lombo. A angulação frontal e traseira devem ser moderadas (e obviamente paralelas). A cabeça é um cubo sobre outro cubo (focinho e crânio). O peito é profundo e largo, a ossatura é substancial, mas não pesada. Esta descrição lembra a dos cavalos da raça Quarto de Milha e, de fato, o trabalho do Bullmastiff exige que ele faça muitos dos mesmos movimentos de um Quarto de Milha: ficar em pé ou mover-se silenciosamente até que seja preciso entrar em ação, ser capaz cobrir muito rapidamente curtas distâncias, fazer curvas e paradas rápidas e ganhar velocidade rapidamente ao mudar de direção.

     O Bullmastiff precisa ter poder de matar rapidamente um grande cão de caça e capturar o caçador furtivo, tudo num período muito curto de tempo. Tem que ter o um bom centro de gravidade para poder imobilizar e segurar um homem adulto que se encontra numa situação difícil. Hoje, não esperamos realmente que a maioria dos bullmastiffs precise dominar ou abater cães de caça em propriedades privadas, mas é bom que eles ainda sejam capazes de derrubar e segurar um ladrão ou alguém que esteja atacando seu dono. Então, vamos examinar como a estrutura adequada se presta à capacidade de fazer isso.

     Primeiro, observemos a cabeça. O crânio grande e quadrado é fronteado por um focinho largo e também quadrado. O crânio é um aríete poderoso, e as bochechas bem desenvolvidas acrescentam um poder tremendo ao aperto das mandíbulas. O focinho precisa ser largo, com os dentes caninos bem separados para aumentar a força da pegada. A mandíbula inferior precisa ser larga, pois não há força de preensão em uma mandíbula estreita.

     O enrugamento da sobrancelha não deve ser excessivo. Deve ser facilmente notado quando o cão fica alerta porque o enrugamento fica muito mais pronunciado. Essa é uma maneira muito fácil para um gamekeepers saber se o cão estava alertando sobre alguma coisa. É por isso que o padrão exige uma quantidade razoável de rugas quando se está em alerta.

     Os olhos são de tamanho médio e inseridos sob sobrancelhas fortes. Esta é uma proteção contra a área cobertas de arbustos em que o cão trabalha e serve também de alguma proteção contra oponentes, humanos ou animais. As orelhas são de tamanho moderado e quando o cão está alerta a ponta inferior deve estar na altura dos olhos. Ademais, orelhas grandes são prejudiciais para um cão em um confronto, pois podem ser facilmente agarradas, o que além de doloroso, permite ao oponente controlar a cabeça do animal.

     O pescoço tem uma circunferência quase tão grande quanto o crânio. Isso dá um forte apoio à cabeça. Há um ligeiro arco no pescoço, que atua como amortecedor, como, por exemplo, quando o cão corria de focinheira e após o impulso saltava, agindo feito um aríete para derrubar o bandido. O pescoço deve fluir suavemente até os ombros. Os ombros devem estar moderadamente angulados. A norma menciona apenas a angulação traseira, mas o bom senso determina que as angulações dianteira e traseira sejam iguais. Ombros muito retos fazem com que o cão não tenha alcance e tenha uma marcha mais forte, o que não é apenas cansativo, mas ineficaz. A ligeira inclinação dos ombros também é um amortecedor para o peso do corpo do cão quando as pernas que atingem o solo.

     Cães com ossos e peso corporal muito leves podem funcionar com grandes angulações, mas os com massa corporal substancial precisam de pernas bem abaixo do corpo para lhes dar bom suporte. Um excesso de angulação colocaria o conjunto traseiro bem atrás do corpo, tirando gravemente o suporte do peso do cão.

     O suporte da forma substancial do cão é reforçado pelas costas curtas e pelas pernas colocadas diretamente sob os quatro cantos do corpo. Costas moles são uma fraqueza grave em um cão que precisa de coordenação da frente para trás para partidas e paradas rápidas e mudanças de direção. Da mesma forma, costas arqueadas interferem no fluxo adequado de coordenação da frente para trás.

     Costas longas podem tornar mais fácil para um cão realizar um trote longo e largo, mas é preciso lembrar que o Bullmastiff não usava essa marcha em seu trabalho. Caminhava com o gamekeeper até que um invasor tenha sido detectado e então solto. Não é um cão que precisava ir trotado até o alvo, mas que teria corrido até ele, sendo a surpresa e a velocidade dois de seus poderosos trunfos. Qualquer pessoa atingida por um bullmastiff correndo em alta velocidade não se levanta e vai a lugar nenhum.

     Embora o flanco deva ser esgalgado, não deve ser de modo pronunciado. A falta de esgalgamento interfere na livre movimentação das patas traseiras. Enquanto um esgalgamento moderado dá continuidade à aparência de substância e força do corpo sem enfraquecer ou impedir a força do cão.

     Deve haver um ligeiro arco sobre o lombo. Como o Bullmastiff não possui angulação grande, o leve arco indica uma leve ponta da pelve, o que auxilia no bom funcionamento da tração traseira. O arco é apenas ligeiro e apenas sobre o lombo. Não deve estender-se pelas costas.

O Bullmastiff deve ter coxas poderosas e bem desenvolvidas. A falta de substância nos músculos das coxas não é bonita nem funcional. Músculos longos e fibrosos nas coxas podem funcionar para um cão cuja marcha de trabalho adequada é um trote longo e sustentado, mas para cães que precisam fazer partidas e paradas rápidas e mudanças de direção, uma musculatura mais curta e forte se torna de maior necessidade.

      O padrão exige que a cauda seja portada alta. Uma cauda baixa é obviamente o resultado de uma garupa muito íngreme. Embora a cauda deva ser colocada alta, ela não deve ser carregada nas costas como um cão de caça. Pode ser elevada bem acima da linha superior do corpo, pois para os gamekeepers um dos sinais mais evidentes de que um bullmastiff avistava algo era a sua cauda levantada visivelmente. Não há nada de errado em carregar a cauda acima da linha do corpo, mas o bullmastiff não é um cão de caça.

     Para sustentar um corpo substancial com costelas bem arqueadas e boa largura da frente para trás, as pernas devem ter ossatura substancial. Não só não é bonito ver um cão grande com pernas finas, como também é uma ameaça para a capacidade do cão fazer o seu trabalho corretamente. O peso do corpo pode contundir tendões e as patas. As patas são fatores muito importantes na função de um cão. Bullmastiffs trabalharam basicamente em terrenos acidentados. Eles precisavam de almofadas grossas e pesadas e patas firmes. Patas abertas são uma falha grave, e devem ser. Dedos abertos no solo áspero e falta de amortecimento devido às almofadas planas, irá paralisar um cão em muito pouco tempo.

     O Bullmastiff precisa de um temperamento dócil, mas alerta. Tem que ter interesse real no que está acontecendo ao seu redor. Ficar quieto não significa que um cachorro esteja desinteressado, e estar hiperativo não significa que um cachorro seja capaz de se concentrar em seu trabalho. O cão deve sempre dar uma aparência de poder, mas usá-lo somente quando necessário.

     Um Bullmastiff fino ou atarracado não tem forma para cumprir a função para a qual a raça foi desenvolvida. Gordura não é substância. Um bom cão de trabalho deve ter músculos bem definidos e estar em forma. Se um cachorro não consegue contornar um ringue sem respirar, certamente não poderia correr a toda velocidade contra um caçador furtivo e imobilizá-lo até a submissão e até tirar o cão de caça de cena. Os cães de trabalho precisam ser exatamente isso, cães de trabalho, em toda a sua forma física, bem como na categoria AKC.

     Portanto, agora temos uma imagem do Bullmastiff como um cão que caminhava ou corria a todo vapor. Precisava estar alerta, mas sob controle. Precisava de um centro de gravidade estável, mas com pernas suficientes fortes para ser ágil. Precisava de cabeça e mandíbula fortes, boa substância, mas nunca peso ou constituição pesada. Precisava de pernas substanciais e patas e bem acolchoadas. Em outras palavras, o Bullmastiff é um cão forte, musculoso e robusto, com excelente equilíbrio das partes do corpo e agilidade para fazer o trabalho de um Night Dog, quer viva em uma vasta propriedade ou numa pequena casa. Ele ainda é um cão de guarda, um cão de trabalho, e mesmo que sua principal ocupação hoje em dia seja um ringue de exibição ou como companheiro de família, ele nunca deve perder a capacidade de fazer o que o padrão da raça exige. Contanto que a forma seja baseada na função para a qual o cão foi concebido e os criadores adiram a essa forma, o Bullmastiff manterá a função para a qual foi projetado.

     O primeiro padrão da raça foi proposto por V.D. Thomas, secretário fundador do Midland Bull Mastiff Club, o primeiro clube especializado de Bullmastiff. O padrão foi aprovado por unanimidade em 4 de setembro de 1925.

Características Gerais: A expressão de um Bullmastiff deve ser de coragem, atividade e força. A disposição do cão deve ser alegre e a timidez a primeira coisa a ser evitada. A inteligência deve sempre ser mantida em vista. O tipo é um cão naturalmente inteligente e por meio de cuidadosa reprodução e treinamento, essa inteligência pode ser desenvolvida com muita força.

Tamanho: Fêmeas, de 34 a 40 quilos, altura na cernelha de 58 a 63 centímetros. Machos, de 40 a 49 quilos, altura na cernelha de 60 a 66 centímetros. Cães muito altos devem ser evitados. Os criadores devem lembrar-se de que a pretensão não é a de produzir um cão tão grande como o Mastiff.

Cabeça: Quadrada e compacta. Em hipótese alguma deve ser longa ou parecida com a do Dogue Alemão. O focinho também é quadrado. Pescoço curto e delineado em ombros bem definidos. As orelhas, por sua vez, não devem ser grandes e caídas, mas de tamanho entre o Bulldog e o Mastiff, mostrando uma expressão alerta quando em atenção. Os olhos devem ser preferencialmente escuros, embora o castanho não deva ser considerado como uma desqualificação, desde que o cão confirme a tipicidade. Sendo apenas uma falta leve. O prognatismo não é considerado uma desqualificação em vista da criação do cão. Rugas no crânio são desejáveis, mas não essenciais.

Corpo: Peito musculoso e largo. Bem desenhado e não muito longo. Os parâmetros para todas as proporções devem ser os já descritas. O cão não deve ser muito frouxo. Pernas paralelas. Jarretes de vaca ou frente curvada tem de ser evitadas. A cauda deve ser espessa na base e ir afilando gradualmente, mas não tanto como no Bull Terrier. Cauda alegre é desqualificante. A cauda curvada não desqualifica, no entanto, a cauda reta é a preferível. O tipo de cauda de Bulldog pode ocorrer de tempos em tempos. O pelo deve ser duro e curto, semelhante em textura ao do Mastiff ou do Bulldog. Pelo longo é definitivamente uma desqualificação.

Cores: Fulvo ou tigrado em quaisquer tons. Máscara negra é preferível. Pequenas marcações brancas no peito e nas patas são aceitas, porém, manchas brancas no corpo devem ser evitadas. Os criadores devem lembrar que um cão com um corpo pobre e uma boa cabeça é tão ruim quanto um cão com uma cabeça fraca e um bom corpo.

     Segue-se, agora, o padrão atual da CBKC, validado por seu Conselho Cinotécnico e que está em vigor desde 10/08/2023. A decisão de colocar aqui a tradução do padrão utilizado pela FCI ao qual a CBKC é parte integrante ao invés daquele elaborado pelo KC (The Kennel Club) inglês, ocorreu por dois motivos. Primeiramente é que as diferenças entre os dois padrões são mínimas e em segundo porque os criadores brasileiros, se não todos, a grande maioria, estão vinculados a CBKC-FCI e não ao KC.

APARÊNCIA GERAL: Construção poderosa, simétrico, exibindo muita força, sem ser pesado; sadio e ativo.

COMPORTAMENTO/TEMPERAMENTO: Poderoso, firme, ativo e confiável. Entusiasmado, alerta e fiel.

CABEÇA

REGIÃO CRANIANA

Crânio: Largo e quadrado, visto de qualquer ângulo, algumas rugas quando em atenção, mas não quando em repouso. Ampla e profunda. Stop: Pronunciado.

REGIÃO FACIAL

Trufa: Narinas bem abertas. Trufa larga com narinas amplamente abertas; plana, nem pontuda nem projetada para cima quando vista de perfil. Focinho: Focinho curto; a distância da ponta da trufa ao stop é de aproximadamente um terço da distância da ponta da trufa ao centro do occipital; largo sob os olhos, sustentando aproximadamente a mesma largura até a ponta do focinho; truncado e terminando quadrado, formando ângulo reto com a linha superior do focinho e ao mesmo tempo proporcional ao crânio. Lábios: Não pendentes, nunca ultrapassando o nível da mandíbula. Maxilares/Dentes: Mandíbula larga até o fim. Nivelada (mordedura em torquês, borda a borda) é desejada, no entanto, um leve prognatismo inferior é permitido, mas não preferido. Caninos amplos e inseridos separados, outros dentes fortes, nivelados e bem inseridos. Bochechas: Bem cheias.

OLHOS: Escuros ou castanhos, de tamanho médio, inseridos mais afastados que a largura do focinho, com um sulco entre eles. Olhos claros ou amarelos são altamente indesejáveis.

ORELHAS: Em forma de V, caídas para frente, inserção alta e separadas, no nível do occipital, dando uma aparência quadrada ao crânio, o que é muito importante. Pequenas, de cor mais escura do que o corpo. A ponta da orelha, quando em atenção, fica no nível dos olhos. Orelhas em rosa são altamente indesejáveis.

PESCOÇO: Bem arqueado, de comprimento moderado, muito musculoso e quase igual em circunferência, ao crânio.

TRONCO

Dorso: Curto e reto, conferindo um porte compacto, mas não tão curto de modo a interferir em sua atividade. Dorso carpeado ou selado é altamente indesejável. Lombo: Largo e musculoso, com boa profundidade dos flancos. Peito: Largo e profundo, bem descido entre os membros anteriores, com o esterno profundo.

CAUDA: Inserida alta, forte na raiz e afinando, alcançando os jarretes, portada reta ou
curvada, mas não como os hounds. Cauda em manivela é altamente indesejável.

MEMBROS ANTERIORES 

Aparência geral: Pernas bem separadas, apresentando uma frente em linha reta. Ombros: Musculosos, oblíquos e poderosos, não sobrecarregados. Antebraços: Poderosos e retos, de boa ossatura. Metacarpos: Retos e fortes. Patas anteriores: Bem arqueadas, pés de gato, com dedos redondos, almofadas duras. Unhas escuras são desejáveis. Patas espalmadas são altamente indesejáveis.

MEMBROS POSTERIORES

Aparência geral: Pernas fortes e musculosas. Coxas: Bem desenvolvidas, denotando poder e atividade; não pesadas. Jarretes: Moderadamente angulados. Jarretes de vaca são altamente indesejáveis. Patas posteriores: Bem arqueadas, como pés de gato; almofadas duras. Unhas escuras são desejáveis. Patas espalmadas são altamente indesejáveis.

MOVIMENTAÇÃO: Indica potência e objetividade. Em movimento reto, nem os anteriores, nem os posteriores se entrecruzam ou trançam, anterior direito e posterior esquerdo elevam-se e abaixam ao mesmo tempo. Uma linha superior firme, não prejudicada pelo impulso poderoso das patas traseiras, denotando equilíbrio e harmonia de movimento.

PELAGEM

Pelo: Curto e duro, resistente a intempéries, bem assentado em todo o corpo. Pelagem longa, sedosa ou lanosa é altamente indesejável. Cor: Qualquer tonalidade de tigrado, fulvo ou vermelho; a cor deve ser pura e nítida. Uma pequena mancha branca no antepeito é permitida. Qualquer outra mancha branca é indesejável. Máscara preta é essencial, com tons escuros em direção aos olhos, com marcação preta ao redor dos olhos, o que contribui para a expressão típica.

TAMANHO / PESO
Altura na cernelha: Machos: 64 a 69 cm / Fêmeas: 61 a 66 cm.
Peso: Machos: 50 a 59 kg / Fêmeas: 41 a 50 kg.

FALTAS: Qualquer desvio dos termos deste padrão deve ser considerado como falta e penalizado na exata proporção de sua gravidade e seus efeitos na saúde e bem estar do cão.

FALTAS DESQUALIFICANTES

  • Agressividade ou timidez excessiva.
  • Todo cão que apresentar sinal de anomalia física ou de comportamento deve ser desqualificado.

NOTAS:

  • Animais machos devem ter dois testículos de aparência normal, bem descidos e acomodados na bolsa escrotal.
  • Somente cães clinicamente e funcionalmente saudáveis e com conformação típica da raça deveriam ser utilizados para reprodução.

Alguns links interessantes para iniciar pesquisas

     Versão online do primeiro livro escrito sobre o Bullmastiff, intitulado “The Bull- Mastiff As I Know It” foi publicado em 1932. Algumas curiosidades sobre a obra é que ela foi lançada por conta própria do autor, Arthur Craven, que nunca criou ou teve bullmastiffs e supostamente julgou a raça apenas em 1931 em Sheffield no ano de 1931.

     Artigo interessantíssimo, publicado em março de 1911 na revista “The Field”, por Count Vivian Hollender e intitulado “A Plea For The Bullmastiff”. O tema do texto é sobre a preservação da raça em todas as suas qualidades. 

 
 
     Artigo com título de “Formula One”. Escrito por Amy Fernandez e comenta sobre a influência e os mistérios cercando S. E. Moseley.
 
     
 
     Artigo versando sobre a história da raça. Possuí fotos incríveis. O título é “Just A Little Dash Will Do You – How the Bull-Mastiff Became the Bullmastiff” e foi escrito por Amy Fernandez. 
 

     Artigo escrito por David Hancock, chamado “What is type in a Bullmastiff”, em que ele fala sobre o que seria um Bullmastiff típico.

 

     Outro artigo de David Hancock, o título é “The Way We Were” e versa sobre os problemas dos padrões na criação de cães. O primeiro link se trata da primeira publicação apareceu na “The Countryman’s Weekly” em 14 de julho de 2000, o segundo link é uma revisão feita anos depois.

 

     Artigo de Castro-Castalia sobre os cães famosos de S. E. Moseley e alguns comentários sobre o mesmo.

 

     Artigo de Castro-Castalia sobre alguns cães que estão nas bases dos pedigrees atuais. Possuí foto bem interessantes.

 

A HISTÓRIA DO BULLMASTIFF PARTE IV – IMAGENS

Imagens antigas:

Osmaston Turk

Biggs’ Osmaston Grip

Thorneywood Terror

Farcroft Fidelity

Shireland Vindictive

Tiger Torus

Ch. Simba

Springwell Major

Irmão do campeão Roger of the Fenns (não registrado)

Ch. Bubbles

Rodhian (década de 40)

Um bullmastiff do início do século XX

Mais bullmastiffs do início do século XX

Classe ‘Gamekeepers Dog’ numa exposição em 1920

Pintura intitulada “The Poacher at Bay”, de Richard Andsell, 1865

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